quinta-feira, 9 de maio de 2013

Séries de TV - In the Flesh (BBC; 2013)


 Resolvi, depois de me surpreender com esta recente produção britânica (canal BBC Three), tecer alguns comentários acerca da mesma. Eu já deveria ter publicado isto há algum tempo, mas tudo bem, o importante é que finalmente saiu. Pode-se dizer que estarei analisando-a e, também, indicando-a. Claro! Afinal esta merece. Deixo logo de antemão que esta série é uma viagem, em todos os sentidos da palavra, nos trazendo diversos conflitos morais num mundo pós-apocalipse que já está se reestruturando, pelo menos aos poucos. Posso dizer que a jornada, apesar de surreal e curta (são epenas 3 episódios, infelizmente), merece a espiada e, acima de tudo, uma boa reflexão.



 Vamos lá. In the Flesh começa mostrando zumbis. Mas calma, não é outra versão de 'The Walking Dead'. Na verdade passa longe disso. Logo somos apresentados a esta pequena cidade do interior da Inglaterra, algum tempo depois do início da reestruturação do mundo, ou seja, o "apocalipse zumbi" chegou, já passou pela fase "corram dos zumbis e atirem loucamente" e já exterminaram muitos deles ou morreram tentando, e agora tudo começou a ser refeito. Esta fase "pós-pós", por assim dizer, nunca fora tratada numa série ou filme antes (ok, George A. Romero já fez algo parecido com "zumbis pensantes", e é o que chegou mais perto do tema em se tratando de lidar com estas criaturas das mais diversas formas, mas aqui a coisa não é bem assim), o que torna tudo ainda mais interessante de se ver.

 Em meio a esta reestruturação mundial, temos a verdadeira protagonista da série: a PDS (Partially Deceased Syndrome, ou na tradução literal, Síndrome do Falecimento Parcial). Este nome foi dado ao estado em que se encontram os famosos zumbis, pelo menos após o tratamento. Seria como se estes tivessem rescussitado (e foi o que aconteceu mesmo!), sido tratados com um remédio criado para "erradicar" este estado raivoso deles (ou seja, o momento onde eles simplesmente só atacam), e a partir daí eles voltam a ser o que eram quando vivos, pelo menos parcialmente. Eles continuam mortos-vivos, mas agora conscientes e, pode-se dizer, como quando eram pacatos humanos. Estes não podem comer, nem beber, afinal não precisam, e só deterioraria ainda mais a parte interna do seu corpo morto. A única coisa que os acompanhará para o resto de suas "vidas" é o tal remédio, que mantém o cérebro ativo e as células em um estranho funcionamento, e muita maquiagem orgânica, que ajuda no retorno à aparência humana e viva. Até aí tudo bem, e a série não passaria de uma tentativa de ser algo original no mundo que presenciou a zumbilândia, mas não é somente isso.


 Agora que conhecemos o lugar e a "cura", nos chega finalmente os zumbis tratados e como toda a mecânica funciona numa retomada ao contexto familiar. Afinal, aposto que ninguém jamais pensou na possibilidade de perder um ente querido, enterrá-lo, presenciar o seu despertar maligno, e depois, do nada, que este retorne à família como se tudo não tivesse passado de um pesadelo. Bem, é praticamente isto que acontece com o zumbi central da trama, o Kieren Walker. Um garoto que sempre teve uma vida conturbada e que acabou não tendo um final feliz (este cometeu suicídio), mas que acabou retornando para a família depois de todo o processo de ascensão zumbi.

 O caos parece começar novamente com esta nova empreitada da Medicina, afinal grupos revoltosos espalhados por diversos lugares não aceitam este retorno dos zumbis à tal normalidade, pois não acreditam que o efeito do remédio possa durar ou porquê simplesmente não aceitam mesmo que estes assassinos fiquem sem punição (mesmo com a comprovação de que os "ex-zumbis" não lembram das coisas que fizeram em seu estado raivoso, pelo menos não de tudo, e que realmente não tiveram culpa disto). Apesar da ambientação do roteiro focar nesta pequena cidade da Europa, podemos logo tomá-la como exemplo para o resto do mundo, afinal todo ele está passando por isso. Teremos embates morais que circundam diretamente entre a religião, os "bons costumes" e a política, transformando esta história no que ela realmente é: profunda. Como já falei, a inserção destes ex-zumbis na sociedade, ou melhor, no berço familiar, será radicalmente afetada, pois mesmo a família aceitando aquele ente querido de volta, não quer dizer que o contexto também o acatará. É neste meio problemático que encontraremos personagens incríveis e com feridas muito mais profundas do que uma bala ou uma marretada no crânio poderia ter deixado.


 Kieren será o foco da trama, apesar de outros que passaram pela mesma "ressuscitação" também estarem presentes, mas o centro realmente será o garoto. Como já ressaltei, este suicidou-se, teve o seu "amanhecer dos mortos" e agora retornou ao lar após abandonar seu "estado raivoso" através dos remédios que agora lhe são aplicados. Iremos, a partir de sua chegada em casa, conhecer melhor os seus pais, a sua irmã, vizinhos e outras figuras da cidadela. Como são somente três episódios, a história acaba sendo bem curta, portanto não posso sair falando dos personagens ou do roteiro, pois acabarei soltando alguma bomba de spoiler, mas posso dizer realmente que teremos personagens bastante complexos para aceitar ou simplesmente odiar, vai depender do seu ponto de vista.

 O interessante também na série é nos jogar neste contexto, não somente como espectador, mas também como personagem. Afinal eu, a todo momento, acabava sempre me colocando no lugar daqueles personagens e me perguntava "Eu fico com raiva deste pessoal que não aceita o retorno destes parcialmente-humanos, mas será que eu os aceitaria de fato? Seria fácil colocar um zumbi dentro de casa, mesmo este não sendo mais o mesmo assassino frio de antes?". Uma nova cultura é criada na minissérie, novos tabús e novos preconceitos são diretamente colocados em pauta e esta tal "cura" logo vira o assunto do momento. É muito interessante observar tudo isto acontecendo, mesmo não passando de pura ficção. Mas ei, eu tenho que admitir que para mim foi bem mais real do que qualquer coisa pós-apocalíptica que já parei para assistir, e com certeza foi muito mais construtiva. Sinto muito, The Walking Dead, mas suas discussões são nada perto do que existe em In the Flesh.



 Polêmicas novas, antigas, muito falso moralismo e discussões éticas. Tudo isto está presente nesta minissérie que você precisa assistir. Você, gostando ou não de zumbis, vai se surpreender com ela. Vai por mim! Agora é esperar que a BBC invista numa segunda parte deste excelente projeto, pois o cenário já foi construído, um novo contexto fora criado, e muitos novos personagens podem vir a aparecer. Temos aqui um material riquíssimo, e será muita burrice, mesmo, não aproveitar toda esta estrutura. A notícia ruim é que a audiência da série no seu país de origem não foi lá essas coisas, apesar das excelentes críticas, mas creio que a causa real foi o tema para um canal tão focado em dramas de época ou séries policiais. É triste. Mas fiquei sabendo de uma petição que está rolando pela internet para que uma segunda temporada seja realizada, então o negócio é aguardar mais notícias no futuro. Torço muito para ver uma continuação, direta ou indireta, deste fantástico mundo que fora criado.



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